Projeção matemática foi elaborada com dados fornecidos pela FVS e baseada nas medidas restritivas impostas pelo governo
Manaus/AM – Segue acelerado o ritmo da disseminação do novo coronavírus no Estado do Amazonas, que chegou a registrar um aumento de 180% em apenas uma semana. Em Manaus, que concentra 89% dos casos, um estudo elaborado por professores da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) aponta que, entre os dias 15 e 20 de abril, o número de casos confirmados de Covid-19 na capital deve ultrapassar a marca dos 2 mil.
Até esta quinta-feira (9), Manaus já havia registrado 800 casos de contaminação pelo novo coronavírus. O estado, até última atualização de dados da Fundação de Vigilância em Saúde (FVS-AM), soma 40 mortes pela Covid-19 – 33 só de pessoas da capital.
O estudo elaborado pelo chefe do Departamento de Matemática da Ufam, professor Dr. Alexander Steinmetz, em conjunto com Prof. Dr. Sandro Bitar, analisou os números da pandemia anunciados na última segunda-feira (6) – quando 473 casos tinham sido confirmados em Manaus – e projetou o possível aumento para os próximos meses.
Conforme a análise dos especialistas, em um cenário sem distanciamento social rigoroso, os números indicam uma aceleração rápida que caminha para um pico em maio ou na primeira metade de junho.
Ao G1, Steinmetz afirma que, se o estado tiver 2.000 casos confirmados, é possível que existam, na realidade, entre 14.000 e 20.000 casos totais, incluindo assintomáticos e não testados. “É uma estimativa de todos os casos na população. Muitos casos passam por debaixo do radar porque a pessoa nem percebe que tem a doença”, disse.
“O único cenário que pode evitar a curto prazo uma aceleração de casos em direção a um pico de mais 100.000 casos totais de Covid-19 ao mesmo tempo em Manaus, é um cenário com isolamento social rigoroso. Outros cenários de isolamento que estudamos não podem evitar uma aceleração de casos a curto prazo”, ressaltou o matemático.
Projeção de casos TOTAIS* de Covid-19 em Manaus a partir de 6 de abril de 2020
Período | Distanciamento social | |||
Sem | Limitado | Intermediário | Rigoroso | |
15 dias | 25.000 | 17.000 | 9.000 | 5.000 |
30 dias | > 50.000 | > 50.000 | 30.000 | 9.000 |
60 dias | > 50.000 | > 50.000 | > 50.000 | 26.000 |
Fonte: Departamento de Matemática da UFAM (*pessoas diagnosticadas, não testadas e assintomáticas)
O especialista avalia que um aumento de casos totais acima dos 50.000 antes de junho pode resultar em mais de 1.000 mortes, com centenas por dia. “Mesmo trabalhando com a hipótese, infelizmente, demasiadamente otimista, que todos os pacientes poderão receber o devido cuidado médico, com vaga em UTI e ventilador, se necessário”, ponderou.
Ele alertou, ainda, que “50.000 casos significa pelo menos 1.000 hospitalizados em UTI.”
Na terça-feira (7), o governador Wilson Lima declarou que “se a gente não tivesse aumentado o rigor de medidas restritivas, teríamos números bem superiores aos que são apresentados agora”. Em coletiva de imprensa, nesta quinta-feira (9), a diretora-presidente da Fundação de Vigilância em Saúde (FVS-AM), Rosemary Pinto, declarou que 80% da população de Manaus pode ser contaminada caso as medidas de prevenção não sejam respeitadas pela população.
“Se me perguntar qual o potencial de população a ser afetada, eu digo que 80% de dois milhões e 200 mil habitantes em Manaus podem contrair o vírus. A única forma de isso não acontecer é se nós permanecermos isolados”, disse Rosemary.
Questionado sobre o número, o professor Dr. Alexander Steinmetz afirmou ao G1 que, sem distanciamento ou com distanciamento mínimo, é possível que 80% da população da capital amazonense seja infectada.
“Mas no nosso estudo consideramos o seguinte: antes de chegar nesse ponto, todos os países tomaram medidas ainda mais drásticas de forçar as pessoas a ficarem em casa quando o número de casos ultrapassou um certo limiar”, explicou. “Com certeza, o Governo do Amazonas vai ser forçado a tomar medidas ainda mais drásticas”.
Projeção para 15 dias
Baseado nos 473 casos confirmados em Manaus na segunda-feira (6), o estudo dos professores estima que até o dia 21 de abril, em um cenário essencialmente sem distanciamento social, os casos totais de coronavírus (incluindo confirmados, assintomáticos e não testados) podem ser em torno de 25.000 em Manaus.
Para o cenário com distanciamento limitado, a previsão é de 17.000 casos. Com distanciamento intermediário o número cai para 9.000 casos, e com isolamento rigoroso, 5.000 casos totais.
Projeção para 30 dias
De acordo com o Dr. Alexander Steinmetz, em um cenário sem distanciamento social, “os casos cresceriam de maneira tão acentuada (ultrapassando a barreira de 50.000 casos totais daqui a 20 dias) que nós consideramos que haverá, com certeza, medidas ainda mais importantes que serão adotadas, em termos de distanciamento social, por gestores públicos que influenciarão a trajetória de crescimento de casos. Por isso, é difícil estimar a evolução do número de casos, se este limiar for ultrapassado”.
Caso nada seja feito, o professor acredita que é possível atingir um pico em torno de 500.000 casos de contaminação (incluindo confirmados, assintomáticos e não testados) na segunda metade de maio.
Com distanciamento social limitado, o estudo indica que a barreira de 50.000 deve ser ultrapassada por volta dos 20-25 dias.
Análise
Para o chefe de do Departamento de Matemática da UFAM, Dr. Alexander Steinmetz, o distanciamento social intensivo e rigoroso como única maneira de controlar a epidemia neste estágio a curto prazo (na ausência de testes em massa da população) é um consenso esmagador na comunidade científica.
“Parecido com o consenso sobre o aquecimento global e sobre a evolução por seleção natural, porém no caso do distanciamento social temos um fato científico que pode ser verificado a curtíssimo prazo”, avaliou.
O especialista acredita que essa epidemia pode ser controlada, a curto prazo, essencialmente, de duas maneiras: por um método de “força bruta” com um altíssimo custo socioeconômico, que é o isolamento social rigoroso ou pela testagem em massa da população, um método que requer tecnologia e ciência.
“Estaremos sentindo na pele o custo socioeconômico de ter negligenciado a ciência e a tecnologia, deixando o Brasil despreparado nestas áreas. Pelo que estamos vendo, infelizmente, o nosso país escolheu para essa crise a solução mais cara, em todos os sentidos”, afirmou.
“Minha impressão é que essa crise está fazendo ou fará a sociedade perceber que importantes decisões por parte de gestores públicos precisam se apoiar em evidências e não em achismos. Embasar decisões em achismos pode custar vidas” acrescentou Steinmetz ao G1.
Fonte: G1 Amazonas